Reencontrando alguns materiais da Campanha da Fraternidade 2015, parei pra pensar sobre aquele momento que tinha como tema “Eu vim para servir”. Há maneiras e maneiras de servir. No entanto, pessoas costumam complicar isso. O serviço está intimamente ligado à vocação, mas entender e vivenciar vocação também passou a ser complicado. É preciso simplificar.

Se partirmos da expressão bíblica, a palavra vocação vem do hebraico “gãrã” e significa chamado. Aparece mais tarde no latin como “vocare” com o significado de “ato de chamar”.

Nas Escrituras Sagradas encontramos diversos desses chamados. A Igreja, em seus mais diversos documentos continua falando, incentivando e motivando vocações. No Documento de Aparecida, por exemplo, o capítulo IV e parte da mensagem final são dedicados à vocação dos discípulos missionários à santidade.

Em linhas gerais, dizemos que nossa primeira vocação é o chamado à vida, pelo menos é o que costumamos responder a quem nos pergunta sobre isso. No entanto, o Documento de Aparecida nos lembra de que não é uma vida qualquer. Trata-se de uma vida especial: “Por assim dizer, Deus Pai sai de si para nos chamar a participar de sua vida e de sua glória”(D.A., 129). Responder essa vocação, porém, exige respostas às outras vocações que a acompanham. Entre elas, está a vocação à santidade, como nos indica o texto da Carta de Paulo aos Efésios: “Deus que é Santo e nos ama, nos chama por meio de Jesus a sermos santos” (Ef. 1, 4-5).

A pergunta é como dar uma resposta acertada. Nossa primeira e grande pista se encontra no livro de Gênesis. Usando um pouco da Antropologia Teológica olhamos para nossos pais e já encontramos a centralidade de nosso chamado. Adão e Eva são chamados a cuidar da criação. Caim, cujo nome significa “Força Divina” é chamado a cuidar de seu irmão Abel, que tem em seu nome o significado de “frágil”. Cuidar da criação e cuidar do outro mais fragilizado é dar resposta ao chamado à santidade.

E o que fazer e como fazer para exercer esses dois cuidados? É preciso simplificar. Quando me perguntam como fazer isso, costumo indicar o mais simples. Peço que a pessoa pense sobre o que gosta de fazer e acredita que faz bem.

Uma pessoa que cozinha bem, e o faz da melhor maneira possível, está respondendo à sua vocação servindo sua família ou, quem sabe, num encontro de pessoas da comunidade. Um professor que se propõe a ensinar executando seu trabalho com seriedade está servindo. Outra pessoa que dirige veículos bem pode ajudar pessoas que necessitam de locomoção.  Quando profissionais da saúde se propõem a salvar vidas, também estão respondendo bem sua vocação.

Há uma mulher em nossa comunidade que, por longos anos, cuidou de sua mãe acamada com muito zelo e paciência e, mesmo não tendo toda ajuda necessária por parte de seus irmãos, continuou servindo. Talvez ninguém de nós que estamos o tempo todo perto do altar, vivenciou tão profundamente sua vocação como ela.

Conheci alguns jovens que encontraram a maneira deles desenhando. Seus desenhos ajudam pessoas refletirem sobre a conduta humana. Outros jovens usam o dom da música. Conseguem catequizar por meio delas ou, como alguns deles, vão aos hospitais acompanhados de quem tem facilidade com humor e, juntos, arrancam sorrisos e fortalecem os que estão doentes, dando-lhes conforto.

Deus nos deu dons para servir. Devemos começar a simplificar isso. Pensemos o que conseguimos fazer bem e coloquemos isso a serviço. Tentar servir por meio de aptidões que não temos é como calçar um sapato que não é do nosso número, vai incomodar, fazer bolhas, machucar. Por isso, quem não tem boa compreensão de texto jamais deveria legislar; quem não tem competência administrativa, jamais deveria ocupar o cargo de governo público; quem não sabe pastorear, jamais deveria ser padre ou pastor. Quem não tem aptidão para lidar com crianças deveria pensar muitas vezes em se casar ou dar-se em casamento. Quem serve sem as aptidões necessárias, fere a si e à comunidade.

Por fim, com um pouco de análise, rapidamente se pode perceber que o autoconhecimento pode nos dar a resposta às respostas que temos que dar. Precisamos ser mais simples. Identificar a vocação é possível quando se presta atenção nos dons e capacidades recebidos de Deus. Por isso há uma imensidão de maneiras de servir sem que seja na esfera clerical. Há diversas maneiras de servir aos outros no mundo. O importante é que cada um sirva os outros doando o melhor de si. É pra isso que viemos e é nisso que consiste a razão de nosso viver.

Diácono Leandro Scarparo